A Cristina Soares, engajada nesta missão de provocar
os escritores dentro de cada um de nós, tem sido uma lufada inspiradora aqui na
Cooperativa.
Na primeira edição do seu curso, cá pela Cooperativa,
a Cristina levou-nos a muitos sítios, aqueles que são cheios de gafes típicas
de quem experimenta escrever, mas sobretudo a sítios onde todos tiveram um
vislumbre da sua voz autêntica.
Vasculhando na coleção de
memórias pessoais, mensagens e motes e com a caneta em punho nasceram histórias bonitas cheias de talento.
E porque foi tão bom, ousei pedir alguns destes momentos
aos escritores- girino que passaram por cá , pudendo assim partilhar alguns dos
resultados líricos feitos.
Palucha na
Carta ao seu Eu Juvenil;
Querida
Palucha dos meus 15 anos
Acredito que
estejas ótima pois que continuas bem guardadinha num cantinho da minha memória,
da minha biografia, enquanto ser humano que tenta cumprir a sua missão,
enquanto torriense, foliona e cidadã do mundo.
Lembro-me
muitas vezes de ti!...
Sabes, em
alguns momentos, gostaria de ter de novo a tua bela idade e, claro, saber o que
sei hoje. Mas se calhar, se assim o fosse, a vida não teria tanta graça, quem
sabe? “On ne serais jamais!”
Sorriu sempre
que te “vejo” de cabelo curtinho, de mãos nos bolsos das tuas “jeans”, a tentar
esconder, de ombros encolhidos, o desenvolvimento do teu corpo; a menina
chocada ao ver os seus amigos a destruírem-se com drogas ou álcool achando que
por isso, são uns grandes homens. Tu sempre caminhando em direção à saúde, à
felicidade das coisas simples. E se te dissesse que aos 24 deixarias de comer
carninha?
Entretanto já
“rolou tanta água” tantos anos se passaram que até já troquei a ordem dos
algarismos, sim já tenho 51 anos, 36 já foram desde esse teu momento tão
rebelde, sonhador e ingénuo.
Se te
dissesse as voltas que a tua vida dá, não acreditarias, acharias impossível
até, mas vou contar-te um pouquinho só para mexer contigo.
Diários
escreverás poucos mais, mas passarás muitas aulas a escrever cartas para as
amigas, cartas tão divertidas, com cenas tuas tão bem relatadas que quem as lê
afirma que parecem um roteiro de cinema. Este teu dom será provisoriamente
suspenso, mas aos 40 se transformará num livro “Conversas Espelhadas” o título
adequado para uma tagarela como tu e que adora trocar ideias consigo mesma.
Lembras-te
quando a “velha” de repente quis que passasses a ser uma senhora, que
arrumasses a casa e aprendesses a cozinhar?
Pois agora és
viciada em cozinha, a tua loja favorita é a dos tachos e panelas e a “velha”,
ainda armada em feminista revolta-se com esta tua paixão.
Não, não
caias ainda para o lado, tu que andas sempre “às turras” com o teu irmão, vais
ter 2 filhos rapazes e ainda vais criar mais 3 enteados, 2 meninas e 1 rapaz
bem rebelde.
Vais adorar
tanto a música brasileira, a partir da tua maioridade, que irás parar ao Brasil
e por lá andar meia dúzia de anitos.
Tenho tanta
coisa para te contar…. mas hoje fico por aqui.
Um beijão
A Rita e as
suas Benditas Botas:
Andei com esta carta emperrada há dias.Entrei numa mastigação
lamentável, na incerteza de te dar 3000 avisos para as palermices que vais
fazer ou se apenas te falava da saudade.Neste papel de quasi-mãe ou mesmo mana
mais velha, não resisto aos avisos amorosos.Digo te o primeiro. Vê lá se
guardas bem as Doctor Martinez, cor de relva e com a biqueira esfolada. Sabes
porque digo isto miúda? Porque além delas serem um
símbolo das manias alternativas que cultivas, vão ser e foram, responsáveis por
passos firmes, que te ajudam a fazer um caminho engolindo a tua timidez.
As benditas botas, mais
do que terem sido a compra mais avultada que os teus pais te fizeram (eles
sempre te deram tanto, mas tu sabes que as contas era sempre a dividir por
três) são, e eu sei que não sabes disto, um amuleto que te empurra para as
missões impossíveis.
Missões Impossíveis
são; Teres um empréstimo do teu irmão mais velho, eliminar as touradas em
território nacional, convenceres o mundo que Nirvana e Soundgarden são
visionários musicais. Ah, e em Casais brancos é impossível criar comunidades
hippies.
Sei que fazes e depois
pensas. Sei que refilas e depois pedes desculpa. Mas esse preto branco que te
assalta é passageiro, assim como a febre das Spice Girls, não te preocupes.
Mas ainda bem que as
doctor Martinez te acompanham na marcha dos desalinhados. Na banda Rock, na
filosofia, nas leituras, nas cantorias e no Teatro da colectividade.
São elas que te
seguram, na turma de Ciências dos filhos dos senhores doutores, que são competitivos
à brava! Não gostas nada disso, mas digo-te que é muito bom saberes do que não
gostas e sobretudo do que gostas.
Guarda os desenhos do
teu irmão de 3 anos, que no futuro vais sentir que são verdadeiras obras de
arte. Cuida dele, mas não te preocupes tanto. Para isso há a mãe e o pai.
Dá um beijo ao pai,
daqueles apertados. Digo-te que moram no meu peito muitas saudades.
Por último, digo-te; Descalcei as botas e
perdi-as de vista. Mas aos 33 percebo que apenas preciso da sua memória.
É bom chegar aos 33 e
lembrar-me de ti. Despedir-me das missões impossíveis e acolher as novas
possibilidades.
R
A Margarida
em Paris:
A
Amelie está em Paris, a passear nas ruas perto da Bastilha, nas ruas com lojas
de decoração e pastelarias maravilhosas.
Mas
o dia começa a escurecer e a Amelie começa a correr parra chegar ao rio ainda
de dia.E vai pelo lado esquerdo do rio Sena, até Notre Dame, praticamente a
correr e depois encontra o namorado e de mão dada vão para o Louvre e lá em
baixo vêm a Lua cheia, através dos quadradinhos de vidro.'
A Cristina vai voltar
à Cooperativa para novas edições do “Diz que é Escrita Criativa” a iniciar já
na próxima semana, dia 6 de Abril.
Aparece, aposto que há um escritor talentoso
dentro de ti!